O Brasil, terceiro maior produtor de leite do mundo, vive uma revolução silenciosa no campo. Com presença em 98% dos municípios e mais de 34 bilhões de litros produzidos por ano, a pecuária leiteira está deixando de ser uma atividade familiar para se tornar um negócio cada vez mais profissionalizado — e a digitalização é o motor dessa transformação.
Foi o que aconteceu com a família Secco, de Vila Lângaro (RS). Após décadas ordenhando vacas manualmente, em 2021, os primos João Vitor, Felipe e Eduardo deram um passo ousado: instalaram robôs de ordenha em sua propriedade, a Cabanha DS. A decisão foi motivada por exaustão física, dificuldades sanitárias e a necessidade de tornar a operação mais eficiente.

Hoje, com o apoio de dois robôs da multinacional Lely, cada vaca produz, em média, cinco litros a mais por dia, elevando a produção diária para 3.700 litros. A tecnologia monitora individualmente cada animal, ajustando o número de ordenhas e a quantidade de ração com base na fase de lactação.
O gerente da Lely Center, Laudecir Gross, destaca que já são mais de 300 robôs no Brasil, principalmente no Sul. Com preços entre R$ 1,4 milhão e R$ 1,5 milhão, o investimento é alto, mas cada vez mais necessário: “Quem não investir em tecnologia, vai perder mercado”, afirma.
Além da robotização, a gestão eficiente se tornou palavra de ordem. Silvana Kluger, de Carambeí (PR), utiliza um software que integra dados zootécnicos e financeiros. A propriedade da família produz 8 mil litros por dia e, segundo Silvana, “não dá mais para ser como antigamente. A leiteria é uma empresa.”
Essa digitalização é também um fator-chave para garantir a sucessão no campo. O CEO da Leigado, Giandro Masson, aponta que muitos jovens evitam seguir na pecuária por vê-la como um negócio informal. “Com tecnologia, o campo se torna atrativo de novo.”

Nem todos, no entanto, têm acesso a essas ferramentas. Para atender pequenos produtores, a Embrapa desenvolve soluções de baixo custo, como o app gratuito Roda da Reprodução, com 15 mil usuários, e testes com ordenha robotizada em sistemas a pasto. Segundo o pesquisador André Novo, o modelo permite ordenhar até 90 vacas por dia com menos custos e mais sustentabilidade, inclusive com sequestro de carbono em áreas com eucaliptos.
Com um cenário desafiador pela frente — como a carência de mão de obra e a pressão por produtividade —, especialistas apontam que só sobreviverão aqueles que conseguirem aliar tradição, inovação e gestão.
A pecuária leiteira brasileira está mudando. E quem não acompanhar esse movimento, corre o risco de ficar para trás.
Fonte: Agro Estadão